terça-feira, agosto 11, 2009

Hoje o mar ouve

Eram 4 da manhã. Ela chegou na praia ainda não muito certa do que a levara alí. Os olhos já não destinguiam os limites entre céu e mar lá adiante. O azul-turquesa de um misturava-se com o azul-celeste do outro. Ou vice-e-versa. Seu corpo sentia a maresia entrar e arrepiar os pelos do braço. Não fazia muito frio. A simples sensação de que algo estava para acontecer a fazia tremer um pouco. Deixou-se ficar um pouco alí, parada, contemplando o barulho do mar. Sua mente fez silêncio. Era incrível como o mar sempre houvera sido seu berço preferido. Seu refúgio. Seu norte. Seu chão.

Tirou a roupa e entrou na água. Sentiu seu corpo ser lentamente tragado. Com a sutileza que nenhuma lagoa nunca alcançaria. E foi como se novamente tivesse voltado ao ventre de sua mãe-Terra.

Olhou para o céu e em vez de uma, a lua fez-se quatro. Uma cheia, uma nova, uma crescendo e outra sumindo, assim, todas alinhadas: na direção do topo de sua cabeça, a primeira, até quase se perder no mar, a quarta. Fechou os olhos e os abriu rapidamente, com a impressão de que isso poderia a fazer enxergar normalmente outra vez. E mais uma vez. E uma última. Em vão. As luas brilhavam amarelas no céu já quase azul claro. Nessa manhã, o sol perdeu a hora de nascer. Ou pacientemente aguardava um último sinal.

Seu olhos encheram de lágrimas e no mesmo instante, o céu se fez repleto de estrelas. Tantas estrelas como nunca antes nenhum olho, de nenhuma época, havia visto. Estrelas tão pequeninas, de brilho tão delicado, que pareciam piscar lá no fundo do universo. E não mais que de repente, essas pequenas estrelas começaram, uma por uma, a vir em sua direção. Sem pressa, pequeninas e luminosas. Deixando um pequeno rastro de poeira de luz. E a cada estrela que descia, outra aparecia no céu. Seu choro não se conteve mais quando poucas delas, feito purpurina, se misturaram na sua pele e ao seu redor, no mar.

Seu soluço ecoou em cada concha. Suas lágrimas, tantas, se tranformaram em enormes ondas que logo em seguida se desfaziam nas pedras da areia. E seu peito expandiu tanto e de tal forma que seu grito fez silenciar o mar. O sol nascia no horizonte, pincelando o céu delicadamente com rajadas de luz vermelha-laranja-amarela. O novo dia, enfim raiava.

Isso foi há muito tempo. Há tanto tempo quanto é possível o primeiro homem lembrar. Num tempo onde o mar falava. E hoje ele cala. Hoje ele ouve o eterno grito de libertação de uma alma que se desacorrentou de seu corpo e hoje canta as mais belas canções de ninar, junto com o vento, na beira de todo mar.

domingo, maio 17, 2009

Uma noite, uma espera, vagas lembranças...

Trilha sonora < Click aqui (pressionando "shift")

















Quando te amei
Foi como se não existisse nada além
Nem no tempo nem no espaço
Todas as nuvens se borravam céu afora
E eu sem poder sequer te dar uma flor.
O fogo desgastava cada instante de espera
O vinho já havia se ido
O jantar à luz de velas também
Até o sorvete de chocolate com pedaços de infinito
Tudo pertencia agora às lembranças.
Tudo fazia esperar
Cada instante, um suspiro
À qualquer momento a porta poderia se abrir
E eu te amava em cada fração de tempo
Com vontade de seu riso e de seu abraço
Lágrimas que transbordavam o peito
E estagnavam antes de alcançar o mundo
Nunca saberei ao certo
Se alegria ou tristeza
Sentimentos tão instrínsecos um no outro
Dançando e se enroscando e se enovelando.
Sua ausência preenchia suavemente o quarto
Tão delicadamente...
Me aconchegava entre as colchas e travesseiros
Me embrenhava nos cheiros e me perdia por inteiro.
O violino me fazendo quase chorar...
Tudo estava no seu devido lugar
A ausência no momento devido
Seus passos a te pertencerem e só.
Me sentia tão inteira
Que quase me preenchi por completo
Pequenas gotas de orvalho perdidas para todo o sempre
Isso é talvez o que vá sempre me faltar.
Mas nada mais importava disso tudo
As rosas falavam silenciosamente comigo
E meu peito aguardava seu retorno.
Você viria.
Mesmo com horas de atraso.
A porta se abriria antes do sono chegar.
E a madrugada já se estedia noite afora
E eu me esticava cama adentro.

quarta-feira, maio 06, 2009

Clap, clap, clap

> Trilha sonora < Click aqui (pressionando "shift")

Clap, clap, clap
Os dedos acompanham o ritmo
O corpo balança de lá pra cá
A música ecoa pelo meu quarto.
Cama ainda desfeita,
Pratos na pia,
Pagamento do aluguel por fazer,
Calcinhas para lavar,
Almoço ainda no estágio de planejamento
Alguns pedaços de laranja ao alcance da mão.
Já passam das 13:30 de uma dessas quartas
Onde acordei cedo e voltei a dormir
Despertador tocou novamente ao meio-dia
Hora das pílulas
Hora de abrir as cortinas
E me conectar com o mundo.
Ligações perdidas no celular,
Emails por ler.
Nada me tira do embalo desse jazz...
Clap, clap, clap
Os dedos acompanham o ritmo
O corpo balança de lá pra cá.
A vida acontece em paralelo à tudo isso
Os gerânios continuam a florir na minha janela
A pessoas passam na rua,
Correm para pegar o próximo busu
As crianças brincam incansavelmente no parque
Os bancos, os jornais, a bolsa de valores
O dia já está na metade para eles
Pra mim, ele apenas começou.
Meu corpo espreguiça lentamente
Alcanço uma nuvem com cada ponta de meus dedos
Alcanço o infinito balançando de lá pra cá.
Clap, clap, clap
Os dedos acompanham o ritmo
Pés para frente e para trás
Feito gato, meu corpo acompanha o embalo do jazz
E nada me abala hoje.

quinta-feira, abril 16, 2009

A saga de um amor

Antes eu achava que o amor era um guerreiro solitário e poderoso. Desbravador dos mais inóspitos lugares. Hoje eu vejo quão frágil e delicado ele é. Ele precisa de tanto cuidado... Ele é tão inocente... de vez em quando pensa que tudo pode. Doce ilusão de quem aposta tudo, por achar que não tem nada a perder. Por esquecer das outras sutilezas, por esquecer de suas necessidades básicas para viver. Pode ser que o amor nunca morra, eu realmente não sei... Mas quando os medos e inseguranças do outro tomam conta e reinam poderosos e onipotentes, nada mais vive, nada mais brilha, nada mais floresce. E tudo em volta passa a ser sombrio e frio. Vazio. E perdido nessa imensidão de despropósito, o amor fica muito só em sua pequena redoma cor de rosa. Se alimentando das flores que ainda crescem, e sempre crescerão, regadas pelas lembranças e eternas esperanças de tudo ser como antes. Assim vive o amor, à parte de todo o resto. Às vezes sorri, às vezes chora, mas sabe que sua redoma é seu mundo e não tem muito o que fazer, nem pra onde ir. Um dia ele fará seu próprio casulo, se esquecerá do mundo e por ele será esquecido. E num dia ensolarado de primavera ele sairá voando estonteante por aí. Terá se transformado tanto, em um sentimento tão grandioso e completo em si mesmo, que nada será capaz de destruir nada ao seu redor. Sua luz fará tudo renascer. E esse amor que antes pertencia e era pertencido, será dono de seu próprio nariz. E independerá de um e de outro para viver. Enfim será livre.

quarta-feira, abril 08, 2009

Saudade boa de viver

De dentro da cartola
Lá onde fica a caixinha de lembranças
Bem no fundo da memória.

Lá do outro lado
Onde o vento faz a curva
E o céu encontra o mar

Onde pensamentos se perdem
E me levam junto
Me levam além

Me levam a reviver tudo que fui
Cada momento
Cada risada
Cada perdão

E com o peito cheio de saudade
Daquela boa de se reviver sempre
Uma lágrima brota de meu olho
E eu agradeço aos céus.

quarta-feira, abril 01, 2009

Poesia retirada do baú

Na taca de vinho, no banho de mar... Ca estou eu... Me perdendo pra me achar. No bole-bole, no mexe-mexe, no come-come, no dorme-dorme... tudo que faz de mim um pouco mais essência, me tira da rota por alguns momentos e depois, como sempre, lá estou eu de novo na direção certa. Tudo que desponta e aponta pro mar... Tudo que venta e arrepia a nuca... Tudo que queima a pele e doura os sonhos...

O mundo parece tão pequeno pros meus sonhos que acho que terei que reinventá-lo. Um pouco mais de areia aqui, umas montanhas acolá, uns coqueiros e bananeiras ali adiante... Oh que belezura... O sol e lua dançando paralelos por 12 horas ininterruptas de amor.

Mas que ao som do silêncio da noite, ao embalo morno do vinho gelado, à destreza quase perdida dos dedos sobre as letras, cá estou eu. E estou em todo lugar. Cada fração de segundo é tempo sufuciente pra eu ir e vir, dar cambalhotas e sair gargalhando por ai...

Se de mim sobrar sombra pra contar a história, com certeza ela se encaixara no: "Era uma vez... e viveu feliz para sempre"

domingo, março 22, 2009

Bússola

Assim de repente
No meio de fios e tecnologias
Microfone, computador e webcam
Eu me encontrava exatamente a Sudoeste.

Pela primeira vez me localizei
Pela primeira vez percebi em que lugar estava no mundo.

Assim do nada
Como num passe de mágica
No meio de lembraças de risadas
A exatidão chegou a mim.

E precisamente eu soube
Estar no caminho certo
No de fora e no de dentro
(que no fundo não passam de um só)

E a bússula de 17 anos atrás
De repende me disse que SIM!, era Nordeste.

E eu não tive dúvida alguma
Que enfim ela me guiaria nos próximos caminhos.

sábado, fevereiro 28, 2009

Dentre tudo de tudo

Dentre todas as coisas
De todos os assuntos e sensações
Dentre tantas descobertas
Tantas alegrias e ponderações
Dentre tudo o que foi dito
E tudo o que ainda não foi dito entre nós
Está essa nítida impressão
Que mais beira uma certeza propriamente dita
Que te ter em minha vida
Vai muito além.
Além de todo o perceptível aos seis sentidos
Ultrapassa toda a teia cognitiva
Se funde com o irracional.
E assim, sem explicar,
Fica tudo tão claro, tão encaixado
Que, deliciosamente, a simetria de nossas vidas
Vai se acomodando e se remodelando
Na unidade de nossas almas.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Prosa em poesia

Esses olhos me iluminam e me embreagam.
Não há muito o que fazer
quando o verde se abre e sua alma adentra a minha
a não ser me entregar.
E assim é. Deliciosamente.
A cada dia.
E até de olhos fechados e a muitas milhas away,
sua alma me visita,
me pega pela mão
e me guia por aí.

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Dia após dia

Aqui chove.
Chove, chove, chove.
Não entendo como no céu pode ter tanta água.
Dia após dia
Incessantemente.

Aqui o céu é cinza
E as pessoas correm.
Não entendo para quê tanta pressa.
Dia após dia
Incessantemente.

Aqui tem carros. Muitos.
E eles fazem barulho.
Não entendo o porquê de tanta buzina.
Dia após dia
Incessantemente.

Aqui tem muita loja.
E as pessoas compram muito.
Não entendo porque tentam preencher os vazios da alma com coisas.
Dia após dia
Incessantemente.

Aqui dentro nada disso faz sentido.
E isso já tem tempo.
Agora entendo que rumo dar a minha vida.
Dia após dia
Incessantemente.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Enquanto fazemos planos

Entre uma partida e uma chegada
Aquela sensação de que o dia vai chegar
Mais cedo que mais tarde
Mais perto que nunca

Ainda que o tempo teime em passar normalmente
A despeito dessa minha ansiedade
A despeito dos tantos planos
A despeito de tanta vida que está por vir
Ainda que ele teime, ele está por chegar

Fecho os olhos e me concentro
Naquilo que um dia me disseram:
"A vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos"
Acredito piamente
e por isso torço para que o tempo passe logo
E eu possa tornar isso minha realidade

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Um minuto de silêncio

Alguns instantes
Entre um vôo e uma viagem de onibus
Entre nuvens e montanhas
Entre o lá e o cá
Cá estou eu
No aqui, no agora
no centro de mim
onde não haverá nada além da respiração
nada além da conexao comigo

vim longe pra me achar
se tivesse vindo a pé,
o caminho seria infinito.
Resolvi encurtar as distancias fisicas,
ja que a caminhada para dentro será longa

alguns dias apenas
se estenderão no infinito de minha alma
e de meus anseios

um minuto de silêncio, por favor.